terça-feira, 6 de abril de 2010

Misericória: eu também preciso!


É incrível como os conceitos, muitas vezes já arraigados, ganham novos contornos quando passamos por determinadas experiências.

Após dezoito anos de convertido ao Senhor Jesus, sempre estudando a Palavra de Deus, seja em casa, ou nos cultos, ou na escola bíblica ou, por fim, no seminário, tinha formado em mim conceitos sobre a Graça de Deus, pela qual somos alcançados sem nenhum merecimento, e também sobre a propalada misericórdia divina, que, segundo nos afirma a Bíblia, se renova a cada manhã e são a causa de não sermos consumidos.

No último ano descobri que o meu casamento, que eu achava que estava morrendo, na verdade já tinha ido a óbito fazia tempo, por motivos que não convém registrar agora. A separação, portanto, foi a exteriorização de uma realidade já existente. Não foi inovação. É como a mulher que traz em seu ventre um feto morto, sem saber desse fato, colocando em risco a sua própria vida. A expulsão desse feto, pré-morto, apenas tira da sombra uma triste e irreversível realidade já consumada.

Após essa reviravolta em minha vida, e para torná-la ainda mais intensa, tive a felicidade de conhecer, pouco depois, uma pessoa muito especial, que entendi ser a mulher de minha vida. E isso num momento dificílimo em todos os aspectos, cujos detalhes fogem ao escopo deste artigo. Decidimos nos casar. Inicialmente, diante de Deus e, assim que possível, perante a lei brasileira.

E você, caro leitor, talvez esteja se perguntando a razão desse “testemunho”. É exatamente aí que quero chegar: essa experiência conferiu novos contornos aos meus conceitos de “graça” e de “misericórdia”. Pude perceber como, em alguns casos, há uma distância considerável entre a fé teórica e a fé prática. Fala-se nas igrejas em misericórdia e graça, mas muitas vezes o que se vê é a tentativa de se imposição ao próximo o juízo e a lei. Há uma incrível sede de justiça (para os outros, claro). Também percebi como conceitos (teológicos, eclesiológicos, ou simplesmente religiosos) são colocados acima das pessoas. É como se em nome de uma verdade a ser defendida, a pessoa pudesse massacrar seu irmão em Cristo! Exatamente na contramão dos ensinos de Jesus, especialmente quando Ele disse aquela que viria a ser uma das frases mais repetidas da história: “Aquele que dentre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra contra ela” (Jo. 8.7).

Mas, ao lado dessa desagradável e desgastante experiência de se ver massacrado por alguns em nome de (pré-)conceitos – cujo acerto ou não, não será objeto de análise neste singelo artigo – tenho tido o privilégio de conhecer verdadeiros irmãos que se preocupam em ser bençãos, em ser amigos, em ser instrumentos da misericórdia de Deus... em ser irmãos. São pessoas que, por evidenciarem amor, reafirmam seu testemunho de cristãos, já tendo passado da morte para a vida (1 Jo. 3.14). Como sou grato a Deus pela vida desses irmãos!

Isto é, aqueles irmãos preocupados em julgar e apontar eventuais pontos da lei divina que supostamente teriam sido vulnerados (e quantas vezes eu mesmo integrei esse grupo) não agem, necessariamente, por maldade, mas apenas mostram o agir do homem natural; já aqueles que insistem em valorizar mais as pessoas que seus conceitos ou sua visão religiosa exemplificam, quase que didaticamente, o que significam a misericórdia e a graça de Deus.

Sou grato a Deus porque, ainda que vivenciando um período de turbulências, o Senhor me concedeu a oportunidade de rever muitos dos meus conceitos, passando a prestigiar mais as pessoas, com suas particularidades, virtudes e vulnerabilidades, porque, afinal, foi por elas que Jesus Cristo morreu. Ah, como eu preciso de misericórdia. Tanto de ser alvo dela, quanto de demostrá-la.

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